PERSPECTIVA PARA O DESENVOLVIMENTO

Região Nordeste: perspectiva para o desenvolvimento

por George Emílio Bastos Gonçalves
gebgon@yahoo.com.br

Num país continental a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e Distrito Federal, o tema do desenvolvimento regional tem importância permanente, seja em razão dos aspectos políticos, federativos, econômicos, sociais e ambientais. Na Constituição Federal de 1988 - CF (Art. 3º, I, II e III), são cláusulas pétreas, construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais. Portanto, a questão regional constitui eixo essencial sobre a obrigatoriedade governamental de atuação adequada nas regiões sob a perspectiva do desenvolvimento nacional. O conceito de regionalização, aqui no processo de integração nacional, é imperativo constitucional como política brasileira de desenvolvimento nas suas políticas nacionais, setoriais e regionais combinadas.

São legitimadas por necessidades, interesses e aspirações, fundamentais para se construir uma unidade integrada e solidária no país, a fim de se evitar processo de fragmentação que nos ronda. A divisão do Brasil em regiões é atribuição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE e tem por objetivo agrupar os Estados-membros com características fisiográficas, humanas, econômicas e sociais comuns. A regionalização objetiva auxiliar no processo do planejamento das políticas públicas voltadas para áreas com necessidades semelhantes. A atual configuração regional brasileira é composta de cinco macrorregiões - Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul - reafirmada na CF de 1988, priorizou o desenvolvimento e a redução das desigualdades regionais (art. 43; art. 165, §§ 1,2,3,4,5,6 e 7; art. 170, VII; e, ADCT arts. 34 e 35, caput e §1º). Considera-se imperativo constitucional aquele que visa o combate às desigualdades interregionais e interpessoais de renda, reforçando-se o aspecto da dimensão federativa via regionalização também constitucionalizada (art. 43). Isso, na perspectiva de descentralização política e administrativa, contrapondo-se a uma crescente atuação anticonstitucional, antifederalista, centralista e autoritária dos atuais governos.

A 'Questão Nordeste', levantada no início dos anos 1950 - período de secas, fome, miséria, turbulências e reivindicações políticas (Encontros de Salgueiro e Aracajú) e sociais (CNBB – Campina Grande, CNI - Garanhuns), mobilizou as elites nordestinas e nacionais ainda permanece entre nós. Foi criada uma malha de organizações públicas para atender às demandas da Região Nordeste (Ifocs/Dnocs, 1909; Chesf, 1945; Cvsf/Suvale/Codevasf, 1948; BNB, 1953; SUDENE, 1959). Durante a década de 1970, houve diversas manifestações nordestinas contra o processo de centralização governamental, pelo fortalecimento da SUDENE e da regionalização, criou-se o Centro de Estudos do Nordeste (CENOR,1976) no Recife, dirigido por Gilberto Freyre, entre outros. Na oportunidade, o CENOR recomendava,“...apresentamos a sugestão de um federalismo das regiões a inserir-se em moldura tetra-federativa de repartição de competências entre a União, a Região, o Estado e o Município,...” (FREYRE, Gilberto. Por Quê o CENOR? Recife: Gráfica Editora Santa Cruz, 1976, p.10). O processo de regionalização e a formulação do planejamento regional com recursos estáveis foram definidos na CF de 1988 (art. 165, I, §§1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º; art. 166, II), a maioria não devidamente regulamentada até a presente data. A CF de 1988 promoveu breve processo de descentralização da receita pública, onde governos municipais e estaduais ampliaram sua participação em detrimento da esfera federal.

A retomada do crescente e atual processo de recentralização deu-se a partir do Plano Real (1994), que reduziu gradativamente as transferências de recursos federais para Estados e Municípios, ampliados pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, 2001), com dispositivos mais restritivos. Nesse quadro, também foram gradualmente dissolvidos ou mitigados os organismos regionais de desenvolvimento (Dnocs, 1999; Sudene, 2001; Codevasf, 2004; Chesf, 2008). Entre os organismos regionais, a SUDENE (1959/2001) foi recriada pela Lei Complementar nº 125/2007, que abrange 9 Estados do Nordeste (MA, PI, CE, RN, PB, PE, SE e BA) mais 2 Estados do Sudeste (ES e MG). A LC nº 125/07 determina a recriação da SUDENE, a competência, os instrumentos de ação, receitas e sua estrutura. A SUDENE tem uma situação original no arcabouço institucional brasileiro, de dupla vinculação, porque, nos termos da LC nº 125/07, que a reinstituiu, vincula-se ao Ministério da Integração Nacional, e, simultaneamente, tem de obedecer às decisões do seu reinstaurado Conselho Deliberativo composto por 31 conselheiros, integrado pelo presidente da República nas reuniões especiais, por 11 governadores dos Estados-membros, por 9 ministros de Estado, mais o superintendente da SUDENE e o presidente do BNB, além de representantes de 3 confederações nacionais empresariais e 3 de trabalhadores (agricultura, indústria, comércio e serviços), bem como, 3 representantes de prefeitos da Região, estes sem relação de vinculação ou subordinação ao governo federal.

A principal função da SUDENE é sempre compatibilizar, uma solução negociada que atenda as recomendações e orientações do governo federal e, simultaneamente, as decisões emanadas pelo Conselho Deliberativo. O Nordeste hoje já possui uma malha de instituições universitárias, governamentais, privadas e não-governamentais que lhe assegura condições de estudar, planejar, projetar e executar programas sustentáveis de desenvolvimento. O papel da atual SUDENE é instrumentalizar processos de articulação, de mobilização e de negociação entre as múltiplas instituições locais, regionais, nacionais e até internacionais para atingir metas e objetivos pactuados regionalmente. O Conselho Deliberativo é órgão máximo de articulação e decisões estratégicas da SUDENE e do Nordeste, responsável, além de outras atribuições, o de estabelecer diretrizes e prioridades na sua área de atuação, operacionalização e fiscalização dos seus instrumentos, como o FNE, o FDNE e os incentivos fiscais e financeiros federais. Também cabe ao Conselho Deliberativo a chancela político-institucional no processo de elaboração, implementação, acompanhamento e avaliação do PDNE e encaminhar propostas concernentes à regionalização, aperfeiçoamento, adaptação ou complementação dos programas e políticas públicas relevantes para o desenvolvimento regional sustentável. Conforme estabelecido na LC nº 125/07, o Conselho Deliberativo poderá criar comitês permanentes ou provisórios, fixando no ato de criação as respectivas competências e composições, de acordo com necessidades supervenientes. O Conselho Deliberativo também estabelece a competência para a criação, organização e funcionamento de 2 comitês de caráter consultivo, presididos pelo superintendente da SUDENE: o Comitê Regional das Instituições Financeiras Federais e o Comitê Regional de Articulação dos Órgãos e Entidades Federais.

O atual Conselho Deliberativo, desde 2007, promoveu 10 reuniões até a presente data. Na última reunião realizada no dia 29/07/10, na sede da SUDENE, houve uma demonstração das suas fragilidades institucionais, considerando que não houve quórum mínimo para realização da reunião, de 9 (nove) membros, compareceram apenas 7 (sete), além da ausência dos ministros de Estado, de todos os governadores da Região. O único vice-governador presente, de Pernambuco, ausentou-se após 30 minutos do início da reunião, deixando um secretário estadual no seu lugar, o que não é permitido, porque somente o ministro ou seu secretário executivo, governador ou o vice, podem representar os governos federal ou estaduais. A atual ação do CENOR é pelo fortalecimento institucional da SUDENE, do seu Conselho Deliberativo, dos demais órgãos do desenvolvimento regional sucateados (Chesf, Dnocs, Codevasf, BNB, Fundaj, etc.) e por instrumentos financeiros e fiscais estáveis que permitam a Região Nordeste sair dos atuais níveis de subdesenvolvimento, de pobreza nos desequilíbrios interregionais, intrarregionais e interpessoais de renda.

No contexto, como ação mais urgente e prioritária, o CENOR está lutando pela remoção dos vetos à LC nº 125/07 e pela regulamentação na CF de 1988, do art. 165,§§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 6º e 7º, que determinam a regionalização, com recursos estáveis, para os orçamentos anuais da União e das estatais, compatíveis com a população do Nordeste em torno de 29% (IBGE, 2000), necessários ao efetivo desenvolvimento do Nordeste. Fora disso, os atuais recursos médios variáveis de 10% esporádicos, é só perpetuação da pobreza, do subdesenvolvimento e das políticas assistenciais!

* George Emílio Bastos Gonçalves é economista, professor e diretor do CENOR.